ECONOMIA |
Rio Grande do Sul tem o melhor resultado das contas públicas desde o Plano Real |
Com superávit orçamentário de 2,5 bilhões, Estado volta a ter balanço positivo |
O ano de 2021 ficará registrado na trajetória das finanças do Estado como um período de ruptura de uma situação crítica do início de 2019 para um cenário em que são perceptíveis os efeitos das reformas, privatizações e diversas medidas de ajuste aprovadas pela Assembleia Legislativa e implementadas pelo governo do Estado. O balanço apresentado nesta quinta-feira (10/2) pela Secretaria da Fazenda revela que o Rio Grande do Sul teve o melhor resultado orçamentário desde o Plano Real (1994), no montante de R$ 2,5 bilhões. Esse resultado positivo não era registrado desde 2009.
Ao longo dos últimos 50 anos, o Estado só havia atingido situação similar em sete exercícios, o que ocorre agora em 2021 novamente. Os demais anos de superávit orçamentário foram 1978, 1989, 1997, 1998, 2007, 2008 e 2009.
O balanço foi apresentado em encontro virtual realizado pela Secretaria da Fazenda - Foto: Reprodução
“Esses resultados devem-se à soma de iniciativas dos últimos anos, como os efeitos de médio e longo prazo das reformas”, explica o secretário da Fazenda, Marco Aurelio Cardoso. Exemplo disso é que em 2021, mesmo que fossem expurgados os efeitos das privatizações, os principais indicadores ainda teriam significativa melhora quando comparados a 2020. O déficit previdenciário ficou em R$ 9,5 bilhões em 2021, menor do que os R$ 10,3 bilhões de 2020. Quando comparado com 2019, período anterior à Reforma RS, a queda é de R$ 3 bilhões (-24% nominais).
“Os pagamentos dos fornecedores e da folha dos servidores também já estavam regularizados desde 2020, abrindo caminho para que, em 2021, avançassem os investimentos após as privatizações. São medidas que se somam a resultados que, pouco a pouco, demonstram a importância da persistência do ajuste”, explica Marco Aurelio.
Outro dado que comprova o ajuste em curso no Estado são os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Em 2021, pela primeira vez, o Rio Grande do Sul ficou abaixo dos limites máximos para dívida desde a criação da LRF, situando-se abaixo também dos limites máximos e prudenciais para pessoal.
Os dados apresentados fazem parte do Relatório de Transparência Fiscal (RTF) de 2021, elaborado a partir do Relatório Resumido de Execução Orçamentária (RREO) do sexto bimestre de 2021 e do Relatório de Gestão Fiscal (RGF) do terceiro quadrimestre de 2021 publicados no Diário Oficial do Estado (DOE) em 28 de janeiro, elaborados pela Contadoria e Auditoria-Geral do Estado (Cage).
O secretário da Fazenda apresentou as análises acompanhado do seu adjunto, Jorge Tonetto, do contador e auditor-geral do Estado em exercício, Gilberto Raymundo, e dos subsecretários do Tesouro do Estado, Bruno Jatene, e da Receita Estadual, Ricardo Neves Pereira, além da equipe da Divisão de Informação e de Normatização Contábil (DNC) da Cage.
Resultado primário
O Resultado Primário distingue-se do Resultado Orçamentário principalmente pela exclusão das despesas com o serviço da dívida. Em 2021, houve superávit primário de R$ 4,7 bilhões, com uma melhora de R$ 1,79 bilhão sobre o 2020 (R$ 2,86 bilhões). Esse resultado reflete os efeitos das reformas estruturais e o engajamento da atual gestão com o equilíbrio fiscal, além da retomada da atividade econômica e dos efeitos inflacionários recentes, com reflexos diretos na arrecadação do ICMS.
Crescimento das receitas
A arrecadação bruta de Impostos, Taxas e Contribuições totalizou R$ 57,9 bilhões em 2021, correspondendo ao crescimento de aproximadamente 27% em relação ao ano anterior (R$ 45,5 bilhões).
A receita bruta de ICMS, sem considerar os efeitos da operação de regularização contábil de parte da dívida de ICMS da CEEE-D, cujo impacto foi de R$ 2,57 bilhões, consistiu em R$ 44,8 bilhões frente a R$ 36,2 bilhões arrecadados no ano anterior, isto é, um incremento bruto de R$ 8,6 bilhões (+23,77%).
A melhoria na arrecadação do ICMS decorre da recuperação da atividade econômica, da aceleração inflacionária e da base de comparação afetada fortemente pela pandemia, notadamente os meses de abril a julho de 2020.
Controle das despesas
Os gastos de Pessoal registraram alta nominal de 2,1%, subindo de R$ 30,5 bilhões em 2020 para R$ 31,1 bilhões em 2021, abaixo da variação do IPCA no período (10,06%). O Estado tem conseguido reverter a trajetória de crescimento real observado na última década por meio do controle das despesas de pessoal desde 2019 (vedação de aumentos) e dos impactos das reformas Administrativa e Previdenciária. Com a Administrativa, a expectativa é de desaceleração do crescimento da folha de pagamentos nos próximos anos.
A variação total das despesas correntes registrou um aumento de R$ 2,1 bilhões (+4,55%), abaixo do IPCA acumulado de 2021 (10,06%). O detalhamento do gasto revela que as Outras Despesas Correntes (gastos vinculados e políticas públicas discricionárias) foram o principal vetor de crescimento, apresentando aumento de R$ 1,6 bilhão (+13,06%), impulsionado principalmente por três fatores: despesas relacionadas ao Programa Avançar, que refletiu mais fortemente nas despesas da segurança pública e da educação; pagamento de R$ 432 milhões de dívidas históricas do Estado com os municípios gaúchos referentes à manutenção de programas de saúde municipais do SUS entre 2014 e 2018; e necessária elevação dos gastos com saúde por conta da pandemia.
As despesas totais na função Saúde atingiram R$ 8,22 bilhões, com crescimento de 11,7% em relação à 2020 (+ R$ 859 milhões) e de 32,2% em relação à 2019 (+ R$ 2 bilhões). Essa trajetória é ainda mais expressiva quando se considera que o ano de 2020 já tinha apresentado gastos maiores em Saúde, tendo contado naquela oportunidade com repasses do governo federal. As ações de combate à pandemia, que se prolongou por 2021, continuaram demandando gastos com saúde, em particular com a disponibilização de leitos de UTI, cujo custo compreende, além da estrutura, a aquisição de equipamento de proteção individual (EPIs), equipamentos sofisticados como respiradores, insumos e remédios específicos.
Aumento de investimentos
Foram destinados para investimentos R$ 2,3 bilhões (excluídas as inversões financeiras, que computam, principalmente, os efeitos da privatização da CEEE-D, R$ 3,1 bilhões), dos quais R$ 2,2 bilhões pelo Poder Executivo e R$ 103 milhões pelos demais Poderes e órgãos autônomos. Esse valor é 166% maior do que os R$ 864 milhões investidos em 2020.
Do valor investido pelo Executivo, apenas R$ 280 milhões tiveram como fontes recursos de operações de crédito, transferências obrigatórias e convênios, sendo que os gastos com recursos livres do Tesouro têm apresentado expressivo crescimento, passando de R$ 317 milhões em 2020 para R$ 1,9 bilhão em 2021.
O governo tem direcionado investimentos ao Avançar, programa transversal lançado em junho de 2021 que visa acelerar o desenvolvimento econômico e incrementar a qualidade dos serviços à população. Os projetos contemplados envolvem as principais áreas de atuação do governo, como transportes, educação, saúde, segurança, cultura, esporte e agropecuária.
Limites da LRF
Em relação aos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal, o Estado apresentou avanços em todos os indicadores. O limite de endividamento verificado em 2021 (182,60%) caiu 39,21 pontos percentuais em comparação a 2020 (221,81%), fruto do crescimento da Receita Corrente Líquida (RCL) em percentual muito superior ao da Dívida Consolidada Líquida (DCL).
Pela primeira vez desde a edição da LRF, o Estado apresentou, ao final de um exercício, uma relação DCL/RCL abaixo do limite máximo de 200% definido pela Resolução 40/2001 do Senado. Esse resultado foi reflexo do forte crescimento do ICMS e impactado por aproximadamente R$ 5,6 bilhões de efeitos na RCL por conta da desestatização da CEEE-D e do reconhecimento da receita de IRRF dada a mudança nos critérios de cômputo das despesas de pessoal. Sem tais efeitos, o índice registraria 203,79%, denotando que o controle do endividamento permanece como uma medida indispensável para a sustentabilidade fiscal.
Os indicadores de despesas de pessoal também evoluíram positivamente em 2021. O comprometimento da RCL com as despesas de pessoal do Poder Executivo situou-se abaixo do limite prudencial (46,55%), encerrando o ano em 41,37% (42,49% em 2020). Considerando todos os Poderes, esse indicador fica em 48,72% frente a 49,77% em 2020.
Esses valores são apurados conforme os critérios de cálculo do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS) e ainda divergem da metodologia da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), embora deva ser registrado que o Estado vem convergindo rapidamente para o padrão nacional, o que se comprova pela redução da diferença entre ambos os critérios de 14 pontos percentuais em 2018 para menos de três pontos percentuais ao final de 2021, restando apenas refletir as perdas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) na RCL.
Mesmo considerando os critérios da STN, o Estado encerrou o quadrimestre abaixo do limite prudencial, atingindo, para o Poder Executivo, o percentual de 43,26%, contra 53,10% de 2020. No consolidado de todos os Poderes, cujo limite prudencial é 57%, o Estado apresentou o percentual de 51,10%, frente aos 62,52% no fechamento de 2020.
Dívida e passivos
Em 2021, foram quitados R$ 3,5 bilhões de Restos a Pagar (despesas de exercícios anteriores), incluindo Salários (13º salário de 2020), Investimentos e Outras Despesas. Com a regularização dos pagamentos de salários e fornecedores, o estoque de restos a pagar do Poder Executivo atualmente se compõe dos saldos não pagos à União por força da liminar STF (R$ 14,5 bilhões) e de valores correntes e de investimentos em fase regular de liquidação da despesa.
A Dívida Consolidada Líquida, calculada para fins de apuração dos limites da LRF, atingiu R$ 98,3 bilhões ao final do exercício, incluindo os financiamentos contratados com o governo federal (R$ 73,7 bilhões), bancos públicos, organismos internacionais e precatórios.
O Estado teve deferimento no pedido de adesão ao Plano de Recuperação Fiscal, que está em elaboração, com expectativa de homologação até junho. Até lá, está sujeito a vedações similares às de 2020 e 2021 por conta das contrapartidas exigidas na Lei Complementar (LC) 173/2020, incluindo restrições a aumento de despesa de pessoal e à criação de despesas de caráter continuado.
No fim de dezembro, o Estado concluiu outro marco importante para a regularização de suas pendências jurídicas com a União, incluindo a contingência associada ao descumprimento do teto de despesas, ao qual o Estado se vinculou nos exercícios de 2018 e 2019, como contrapartida ao alongamento da dívida com a União, autorizado pela Lei Complementar 156/16.
A LC 178/2021, que alterou a LC 156/2016, ofereceu alternativas à penalidade original, que cancelava a extensão do prazo de vencimento e exigia o pagamento em 12 meses do diferencial de parcelas referentes ao alongamento (estimado pela União em R$ 15,7 bilhões). Após a aprovação pela Assembleia da Lei 15.757, o Estado assinou os aditivos em dezembro, solucionando a pendência da LC 156, com um valor de R$ 3,8 bilhões sendo incorporado ao saldo da dívida com a União e cujo pagamento será financiado ao longo dos 27 anos remanescentes.
O Estado também tem buscado construir soluções para cumprir a obrigação de quitar até 2029 o passivo acumulado com precatórios, cujo saldo devedor apurado ao final de 2021 somou R$ 15,2 bilhões, o menor dos últimos quatro anos. Num esforço conjunto da Secretaria da Fazenda, Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e do Poder Judiciário, os débitos de precatórios têm sido quitados por meio dos repasses pecuniários mensais de 1,5% da RCL com recursos do Tesouro (R$ 698 milhões) e de novas alternativas de pagamento, como os acordos diretos com credores na Câmara de Conciliação ou a compensação de precatórios com dívida ativa (R$ 185 milhões em 2021).
Outra das principais frentes do processo de ajuste fiscal do governo do Estado, a reorganização do fluxo de caixa levou a resultados expressivos no fechamento do ano de 2021. Nos últimos 20 anos, diferentes governos realizaram saques no Caixa Único, acumulando uma dívida com o Sistema Integrado de Administração de Caixa (Siac) que, em dezembro de 2018, somava R$ 8,26 bilhões (excluídos os depósitos judiciais). A administração estadual conseguiu reverter uma tendência de anos ao reduzir essa dívida em quase R$ 5,6 bilhões. Um minucioso levantamento de fontes e usos dos recursos das contas correntes permitiu esse avanço. Foi adotada uma sistemática de revisão constante nos saldos das contas vinculadas, priorizando a sua utilização de acordo com as possibilidades legais em relação aos recursos livres do Tesouro. Houve esforços para transferir saldos de contas inativas, possibilitando a realocação de recursos para que não ficassem parados em contas correntes, além de revisões dos procedimentos contábeis, orçamentários e financeiros. Como resultado, ao final de 2021, a dívida do Siac caiu para R$ 2,69 bilhões.
O aprimoramento na gestão do fluxo de caixa foi um dos fatores que contribuiu para a regularização da folha salarial e dos pagamentos de fornecedores da Tesouraria Central no final de 2020, bem como a quitação antecipada do parcelamento do 13º salário de 2020 e antecipação do de 2021.
Outra contingência se refere ao Piso Nacional do Magistério. A reforma no Plano de Carreira do Magistério, aprovada em 2020 na Assembleia, eliminou o risco de crescimento desse passivo nos próximos anos ao formalizar a aplicação do piso nacional em todos os níveis do plano de carreira.
O secretário Marco Aurelio ressalta que esses encaminhamentos ajudam, em conjunto com o RRF, a consolidar uma oportunidade para que o Estado regularize o pagamento do serviço da dívida com a União e garanta o encaminhamento para muitos de seus passivos. “A fragilidade do processo de ajuste em curso ainda demanda muita disciplina coletiva para que essa trajetória seja consolidada pelos próximos anos, superando definitivamente a sequência de anos em que o Estado conviveu com atrasos de pagamentos e com a falta de perspectivas para novos investimentos”, avalia.
Texto: Ascom Fazenda
Edição: Secom